No Chão da Casa, No Chão do Santo – A Paz que Encontraram Aqui

Ela cruzou a porta primeiro e o ar parou.

Não foi só a casa que a acolheu -
foi o axé batendo no peito das paredes,
o mesmo que faz vibrar os tambores
quando os guias chegam no terreiro.


"Aqui tem paz", ela pensou.
E eu sabia:
era a paz que só desce quando o sagrado reconhece seu filho e sua filha.

Não era sobre o sofá, o tapete ou a xícara de café -

era sobre os pés descalços da espiritualidade
pisando firme no chão de quem já foi flor, cruz e pemba.



Ele veio depois,
com os olhos cheios de perguntas
e as mãos abertas como um congá improvisado.
Não procurava milagres -
queria o fio de luz que liga um espírito ao outro,
aquela corrente que não se vê,
mas que a gente sente quando o Preto-Velho assente
e o cheiro de café forte enche o ar.


Minha casa, terreiro sem nome, 
não tem gongá dourado,
nem tronos forrados a veludo.
Tem copos d'água nos cantos,
ervas secas penduradas pela sala,
e um sino que toca sozinho
quando os guias acham necessário.


Ela sentiu paz porque os Orixás deixaram a saudade dela em silêncio.
Ele encontrou conexão porque os Exus abriram a estrada
antes mesmo dele bater na porta.


No fim, entendi:
não fomos nós que recebemos um casal -
foi a casa, terreiro sem nome que se lembrou deles.
Como se aqueles espíritos já tivessem dançado em nossos girassóis,
bebido em nossas guias,
ou sentado na mesma mesa em outra vida.

Quando foram embora,
cheiro de arruda ficou.
E o sino balançou sem mãos visíveis -
saudação de quem fica,
promessa de quem sempre volta.


Santiago Rosa

Comentários

  1. 😍😍😍😍😍😍😍😍😍😍😍🙏🙏🙏🙏🙏🙏🙏

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas