No Silêncio das Folhas: A Benção Transformadora da Serpente Sagrada

 Eu já sabia que esse momento viria. Algo no ar carregava um aviso, uma sensação profunda de que essa presença sagrada estava a caminho. Era como se cada partícula ao meu redor, cada sussurro do vento, já prenunciasse a chegada de uma força indescritível, primitiva e infinitamente sábia. Estava tudo preparado, e, mesmo antes de acontecer, eu já a sentia em minha alma.


Então, aconteceu. No meio de um silêncio absoluto — aquele tipo de silêncio que parece engolir o mundo inteiro, deixando apenas o vazio pulsante da ausência de sons —, comecei a ouvir o suave farfalhar das folhas. Era como se o mundo estivesse em suspenso, como se minha audição tivesse sido retirada, mas, ao mesmo tempo, as folhas traziam uma música misteriosa e única. Cada leve som ecoava no meu coração, e logo percebi que não estava sozinho.

Senti uma presença indescritível, imensa, serpenteando entre as folhas e galhos secos ao meu redor. Ela não me assustou; pelo contrário, um estado de leveza, quase de letargia, tomou conta de mim. Era uma paz tão profunda, tão rarefeita, que parecia ser tirada de outro mundo. Essa serpente sagrada não era um mero animal — ela era o símbolo vivo de transformação, a personificação de uma força espiritual tão antiga quanto a Terra.

Quando ela se aproximou e enlaçou suavemente meus pés, senti como se fosse um abraço ancestral, uma benção. Ela subiu, deslizando pelas minhas pernas, de uma maneira tão delicada e reverente, que senti toda a energia dela se fundindo com a minha. Era como se cada movimento dela estivesse me marcando, me transformando, me abençoando. Ali, naquela fusão de alma e matéria, senti o peso da sua força, uma força que purifica e renova tudo o que toca.

O tempo, naquele instante, deixou de existir. Eu vivi aquilo com uma intensidade que pareceu se estender por uma eternidade, enquanto a serpente se movia e se enrolava, deixando a marca da sua presença em mim e no próprio lugar. Ela estava me mostrando seu domínio, sua missão divina, e o propósito de me purificar, de arrancar de mim qualquer traço do que já não me servia. E, assim, após cumprir sua missão, ela partiu, silenciosa e tranquila, deixando apenas o suave barulho das folhas sob seus movimentos enquanto desaparecia.

Mas algo ficou. A promessa do retorno, a sensação de que ela voltaria para completar o ciclo. Fiquei ali, parado, embebido dessa energia, com o coração marcado pela certeza de que fui tocado por uma força sagrada e inquebrantável.


Santiago Rosa

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