A Manifestação Divina de Oxum nas Águas Sagradas

O Poder Transcendental do Momento Divino

por Santiago Rosa

 

          Este artigo foi inspirado por um momento sagrado capturado em vídeo, onde testemunhamos a manifestação de Oxum através de uma médium em transe, sustentada por uma corrente de filhos de fé nas águas de uma cachoeira. Assista ao vídeo aqui antes ou durante a leitura para vivenciar a magnitude deste momento divino.

Há manifestações que transcendem a compreensão humana, momentos em que o véu entre os mundos se dissolve completamente e a divindade se faz carne, água, movimento. A imagem de Oxum manifestada em uma médium, sustentada por uma corrente de filhos de fé dentro das águas de uma cachoeira, é um desses instantes onde o sagrado e o terreno se fundem em uma única expressão de poder e beleza inefáveis.

Quando a Mãe das Águas Doces desce e toma posse de uma matéria, não é apenas uma incorporação que se testemunha. É a própria essência da criação das águas que se materializa diante dos olhos reverentes dos presentes. A médium, em transe profundo, torna-se o canal vivo da divindade — suas feições transfiguradas não mais pertencem ao plano mundano, mas refletem a serenidade primordial dos rios que nunca cessam de fluir, dos mananciais que jamais se esgotam, da fertilidade eterna que jorra da fonte de toda vida.

Ali, sustentada pelas mãos firmes e devotadas de seus filhos da linha de baianos, formando uma corrente humana que se estende como ponte entre o céu e a terra, Oxum habita plenamente seu elemento. Seus movimentos não são aleatórios — cada gesto é poesia líquida, cada ondulação do corpo é a própria dança das águas ancestrais. Ela não está apenas na água; ela é a água naquele momento sagrado. A cachoeira reconhece sua senhora e canta mais alto, as gotas que respingam são bênçãos cristalizadas, o som do correr das águas torna-se mantra vivo que ecoa nos corações de todos os presentes.

Este não é um momento de resolução de problemas cotidianos ou de intervenções pontuais nas aflições humanas. A magnitude do que ali se manifesta transcende tais necessidades imediatas. Oxum, em sua essência divina, não desce para "pegar carga" ou realizar trabalhos no sentido operacional que um guia espiritual o faria. Sua função é de ordem cósmica, de sustentação do próprio princípio vital. Ela é a fonte primordial da abundância, da fertilidade, do amor que move os mundos. Sua presença é o axé em estado puro, a energia criadora que antecede toda forma e que sustenta toda existência.

Quando os filhos a saúdam em reverência, ajoelhados nas águas ou erguendo suas mãos em adoração, eles não estão apenas prestando homenagem a uma entidade. Estão reconhecendo a própria origem da vida que pulsa em suas veias, o rio sagrado que corre através de cada ser vivo, a doçura que tempera a existência e a torna suportável. A reverência é natural, instintiva, inevitável — como poderia ser diferente diante da Mãe que nutre, que embala, que lava as dores e renova as esperanças?

A corrente humana que sustenta a médium em transe não é apenas um suporte físico. É a manifestação visível da rede invisível de fé, devoção e pertencimento que conecta todos os filhos de santo. É a demonstração de que, diante do sagrado, a individualidade se dissolve em comunhão, e todos se tornam um só corpo, um só espírito, uma só oferenda viva à divindade que se manifesta. Cada mão que toca a médium, cada braço que a sustenta, cada corpo que forma a corrente é um elo na corrente maior que liga o Aiê ao Orum, o humano ao divino, o efêmero ao eterno.

A força espiritual presente naquele momento é de uma magnitude que desafia a imaginação. Não se trata de poder no sentido bruto ou imediato, mas de uma potência sutil e penetrante que permeia todas as camadas da realidade. É como se a própria estrutura do cosmos se reorganizasse naquele instante, alinhando-se à presença da divindade. As energias se reequilibram, as vibrações se elevam, o ambiente se carrega de uma sacralidade palpável que permanecerá ali muito depois que a manifestação cessar e a médium retornar à consciência ordinária.

Oxum, nas águas da cachoeira, rodeada por seus filhos em êxtase devocional, é a lembrança viva de que existem realidades para além do visível, forças que nos precedem e que nos sucederão, mistérios que não podem ser desvendados pela razão mas apenas vivenciados pela fé. Sua manifestação não resolve os problemas imediatos da vida, mas oferece algo infinitamente mais precioso: a certeza de que somos amparados por forças ancestrais, de que nossa existência é sustentada por correntes de poder que fluem desde a origem dos tempos, de que nunca estamos verdadeiramente sozinhos.

A imagem da médium em transe, perfeitamente integrada ao elemento aquático, seus gestos em perfeita harmonia com o fluir das águas, cercada pela devoção tangível de seus irmãos de fé, é mais que uma cena tocante. É uma epifania, uma revelação, um vislumbre do divino que se oferece generosamente aos olhos humanos. É o momento em que o impossível se torna real, em que o transcendente toca o imanente, em que a Mãe das Águas Doces nos lembra de nossa origem sagrada e de nosso destino divino.

Que aqueles que testemunharam tal momento guardem-no como tesouro no coração. Pois presenciar a manifestação plena de um Orixá, em toda sua glória e poder, é receber uma graça que marca a alma para sempre, um selo de pertencimento ao sagrado que jamais se apaga, uma bênção que continua a jorrar, como as águas eternas de Oxum, através de todas as vicissitudes da existência humana.

Ora Ieiê Ô! Oxum, Mãe das Águas Doces, que tua doçura nos acalente e tua força nos sustente em todos os momentos de nossa jornada.

Comentários

Postagens mais visitadas