Espelho de Maré: Sou o Reflexo da Mulher Que Não Se Quebra

Há uma hora em que o silêncio da casa ecoa mais alto que qualquer tempestade.

É quando a mulher, envolta nas dobras da própria solidão, se escuta inteira.
E é aí que Maria do Cais chega.


Ela vem das águas profundas, onde o lodo esconde segredos e o brilho das moedas ofertadas reluz memórias.
Ela vem com seus panos molhados de maré, seus olhos que já viram o fundo dos sentimentos, e suas mãos que sabem acolher e também empurrar pro caminho.
Porque Maria não é só consolo, é coragem.
Não é só colo, é espelho.
E quando ela sopra no ouvido de uma filha, não é pra adormecer, é pra acordar.

A mulher que amadurece neste tempo de agora carrega dentro do peito uma história antiga.
Carrega vozes de avós que calaram suas vontades, de mães que se fizeram silêncio pra manter a casa de pé, de tias que esconderam dores atrás de panos bem passados.
Mas ela — essa mulher de agora — está no ponto.
No ponto de se ver, de se ouvir, de se bastar.

Não se trata de falta.
Não se trata de carência.
Se trata de potência adormecida que Maria do Cais cutuca com o dedo de guia.
Ela não chega com promessas de amores que salvam — ela chega pra lembrar que o verdadeiro resgate vem de dentro.

Há quem se aproveite desse tempo em que a mulher se encontra sozinha — e achem que podem manipular suas ternuras.
Jogam palavras doces com veneno por trás.
Oferecem migalhas travestidas de afeto.
Testam o vazio esperando que ela se curve.

Mas a mulher que caminha com Maria do Cais não se curva.
Ela aprende a dançar com o próprio reflexo na água.
Aprende a ouvir o tambor que bate dentro dela mesma.
E quando sente saudade, ela acende vela pra si — e se acolhe.

A presença de um homem, se vier, que venha como bênção, não como bengala.
Que venha por merecimento, não por imposição.
Porque a mulher existe pelo simples e sagrado fato de ter nascido.
Ela não precisa ser escolhida.
Ela é quem escolhe.
E o amor que ela merece não é o que supre uma ausência — é o que respeita sua inteireza.

Maria do Cais, senhora das águas calmas e das marés revoltas, ensina:
a lágrima pode escorrer, mas não arrasta.
A solidão pode bater, mas não derruba.
E a mulher, ah…
a mulher que aprende a andar com as próprias pernas,
que olha pro espelho e vê a herança das que vieram antes —
essa mulher é mar.
É cais.
É navio.
É força que não se compra nem se mede.

E quando ela diz “eu me basto”,
não é orgulho.
É rezo.
É liberdade.
É semente que rompe a terra com coragem de florir sozinha.

Saravá Maria do Cais.
Saravá todas as mulheres que ousam se amar primeiro.
Saravá o tempo da maturidade, onde brota, enfim, a verdadeira liberdade.

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